quarta-feira, 20 de abril de 2011

Mariana Pineda IV - A Segunda estampa

Mariana Pineda
(romance popular em três estampas)
Federico Garcia Lorca, 1925

SEGUNDA ESTAMPA

"Sala principal na casa de Mariana. Tons cinzas, brancos e marfins, como numa antiga litografia, Grupo branco, estilo império. Ao fundo uma porta com cortina cinza, e porta laterais. Há um console com urna e grandes ramos de flores de seda. No centro da peça, um piano e um candelabro de cristal. É noite. Estão no palco La Clavela e os Filhos de Mariana. Vestem a deliciosa moda infantil da época. Clavela está sentada, e ladeando-a, em tamboretes, as crianças. A estância é limpa e modesta, embora conservando certos móveis de luxo herdados por Mariana".

Cena 1
Clavela conta histórias de ciganos para as crianças. As histórias contadas por Clavela se misturam à história de Mariana. Enquadramento ou encaixamento ou mise en abîme?

Cena 2
Mariana pede aos filhos que vão dormir, que Clavela os acompanhe e que rezem Salve-Rainhas e Credos. Sua filha diz que rezará a prece de São João e uma que pede por caminhantes e marinheiros. Mariana manda Clavela descer assim que os filhos dormirem.

Cena 3
Prece de Mariana à porta do quarto dos filhos: "Durmam sossegadamente, meus filhos, enquanto aqui, perdida e louca, sinto queimar-se em seu próprio lume vivo esta rosa de sangue de meu peito. A sonhar com o querosene e o jardim de Cartagena, luminoso e fresco, com o 'pássaro pinta' que se agita por entre as ramas do limoeiro verde! Que estou também adormecida, filhos, e vou revoando por meu próprio sonho como vão, sem saber aonde vão as perguntas mais tênues pelo vento".

Cena 4
Dona Angústias a movimentação naquela "velha e honrada casa" e avisa a Mariana que Dom Pedro está à porta. Ao sair correndo para recebê-lo, Dona Angústias pede calma e a alerta de que não se trata de receber um marido. Mariana diz que lhe dá razão mas não consegue se controlar.

Cena 5
"Mariana chega correndo à porta no momento em que Dom Pedro entre por ela. Dom Pedro tem trinta e seis anos. É um homem simpático, sereno e forte. Veste corretamente e fala de modo doce. Mariana lhe estende os braços e aperta-lhe as mãos. Dona Angústias adota um atitude reservada e triste. Pausa". Cena de muita rensão e angústia. Amor e liberdade dominam a conversa de Mariana e Dom Pedro, que agradece a Mariana e a Fernando o fato de poder estar ali a salvo e em sua companhia. Estão prontos pra lutar e morrerian pela liberdade. Chove e Mariana, num instante, pede silêncio.

Cena 6
Clavela avisa que batem à porta. . Aguardam os outros conspiradores. Mariana pergunta a Pedro se ele sabe quem virá e ele diz que sim. Bons companheiros, poucos, patriotas, pontuais e gente decidida.

Cena 7
Entram três outros conspiradores. Parece que fazem um análise de conjuntura e traçam planos para os próximos passos. A visão de todos é otimista quanto à adesão do povo à causa dos liberais. Mariana, porém, questiona, considerando o medo reinante na cidade, e pede a Pedro que vele por ela, que está prestes a sufocar. Ele não responde. Aguardam  uma  notícia de um quarto conspirador que está para chegar.

Cena 8
"Aparece pela porta o Conspirador 4º. É um homem forte: camponês rico.Veste o traje popular da época: sombreiro pontiagudo com abas largas de veludo, adornado com borlas de seda; jaqueta com bordados e aplicações de pano de todas as cores nos cotovelos, no canhão e no pescoço. A calça, presa por botões de filigrana, e as perneiras de couro, abertas de um lado, deixando ver a perna. Trai uma doce tristeza varonil. Todos os personagens estão de pé junto à porta da entrada. Mariana não esconde a angústia, e olha, ora o recém-chegado e ora Dom Pedro, com ar aflito e perscrutador". O Conspirador 4º traz más notícias: o levante terá que ser adiado porque não há disposição do povo em enfrentar o Governo e todos os conspiradores estão sendo caçados pela polícia. Será preciso esperar mais e guardar bem a bandeira, que a hora chegará. Mariana informa que mandou a bandeira para a casa de uma velha amiga, mas se mostra arrependida, achando que teria sido melhor deixá-la em sua própria casa. O Conspirador 4º continua a apresentar notícias ruins: muitas mortes de liberais em Málaga. Traições. Contudo, todos permanecem firmes no propósito de seguir lutando. Mariana faz promessa a Pedro: "Enquanto eu viver". Como não há mais o que decidir, resolvem beber, quando Clavela aparece para informar que Pedrosa está à porta de sua casa, acompanhado de dois homens. Na confusão que se instala, Mariana manda Pedro fugir e ele concorda imediatamente ("confuso"). O Conspirador 4º argumenta que "é indigno deixá-la" a sós com Pedrosa. Mariana insiste com Pedro: "Vai deoressa". O Conspirador 2º rebate: "Nós não devemos deixá-la abandonada". Pedro ("enérgico"): "É necessário! Como justificar nossa presença?" Todos saem, orientados por Clavela. Maria corre para o piano e começa a cantar uma canção.

Cena 9
"As cortinas do fundo se levantam e aparece Clavela, aterrorizada, com o candelabro de três velas numa das mãos, e a outra posta sobre o peito. Pedrosa é um tipo seco, de uma palidez intensa e de uma admirável serenidade. Dirá as frases com ironia muito velada, e olhará minuciosamente para todos os lados, mas com correção. É antipático. Há que fugir da caricatura. Ao entrar Pedrosa, Mariana deixa de tocar e se ergue do piano. Silêncio". Diálogo de agudíssima tensão entre Mariana e Pedrosa. Ambos sabem mais um sobre o outro que suas palavras revelam. A sequência me soou como uma luta de esgrima, inclusive por seu aspecto erótico (quando da procura pelo anél que caiu, Pedrosa chega a abraçar e beijar Mariana). Logo no início esta indicação cênica: "(Pausa. Nesta cena haverá pausas imperceptíveis e rotundos silêncios instantâneos, nos quais lutam desesperamente as almas dos personagens. Cena delicadíssima de se matizar, procurando não cair em exageros que prejudiquem a emoção. Nesta cena há que se notar muito mais o que não se diz do que o que está se falando. A chuva, discretamente imitada e sem ruído excessivo, chegará de quando em quando enchendo silêncios").  Ao final da cena o tom fica bastante pesado, com Mariana chamando Pedrosa de canalha, que a quer por a perder. Pedrosa diz que, ao contrário, quer salvá-la. e espera um chamado dela. Declara que sabe da bandeira e dos outros implicados na conspiração, mas que pode resolver tudo isso se Mariana ficar com ele: "Eu te quero minha, estás compreendendo? Minha ou morta". Ficam as dissimulações, as ameaças, as "ofertas" de amizade Pedrosa. Maria diz não temer nada, confessa ter bordado a bandeira, e o expulsa de casa, chamando-o covarde. Pedrosa prende Mariana. Mariana ainda tenta fugir mas se descobre realmente presa. "Agora começo a morrer". Dona Angústias avisa que a filha de Mariana chora, com medo da chuva e do vento.

Pano rápido

Imagem: Google images (pt.photaki.com)

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