sexta-feira, 29 de julho de 2011

Ainda


Aquele DVD do Buena Vista Social Club – tão procurado, que demorou tanto, que chegou atrasado, que ainda tenho ali, na estante – o que era? Aquela bolsinha verde – para guardar coisinhas, tipo protetor solar, pouco dinheiro e identidade, que ainda tenho ali, dentro de outra mochila – o que era? Aquele quadro do poeta pouco conhecido, que dizia “há um sonho nascendo, que não se pode perder, nem com a dor esquecer, que alguma chance virá” ¹, que eu ainda tenho aqui na parede em frente de mim – o que era? Aquela minha insistente tentativa de comprar a blusa errada pra você, pra ver se acertava – o que era? Impossível essas coisas não serem ainda. Não serem mais em mim é impossível. Não há tempo, só o espaço que foi vivido e assim permanece inteiro, completo, intacto, inabalável. Eu me abalo sem que minha realidade se abale. Sou eu mesmo. E “o que verdadeiramente somos é aquilo que o impossível cria em nós” ². Aqueles chamados – o que eram? Aqueles silêncios... Esses mesmos silêncios. Aquele cãozinho compartilhado – o que era? O que havia de nós naquele cãozinho – o que era? Aqueles momentos todos – o que eram? Não adianta anotar aqui o que eu sei o que era e que hoje revelam as eternas dores dos sonhos interrompidos. Eternamente vividos no espaço pleno de um tempo que não há. Eu sonhei que sonhava e neste sonho dentro do sonho eu vivi o mais perfeito dos sonhos: a realidade de amar e de ser amado. Agora vivo nele – no sonho – dentro do sonho – do sonho. Minha única vida, impossivelmente criada. 

¹ Celísio Nunes de Souza
² Clarice Lispector

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