sábado, 16 de julho de 2011

Mito e mito na prática



Só me faltava esta: agora tenho que conviver com o "falar de fora do mito" e com o "falar de dentro do mito". Isto: há a praxis do mito. Até agora, inclusive lendo Antropologia, tinha como pacífica a situação de que o mito suspende o tempo e, o que mais me interessava, o espaço. Até porque sempre concebi o tempo como uma das dimensões do espaço. Penso assim da Física até o espaço romanesco. O tempo sempre foi pra mim já uma espécie de mito, ainda que uma forma específica, de que eu precisaria de mais palavras para esclarecer o ponto de vista. O espaço mítico do sertão é "praticado", tem fins econômicos, políticos e acadêmicos, como soube hoje pela produção de uma tese de doutoramento do professor da Universidade Estadual de Montes Claros, a Unimontes e de sua fala em um minicurso na reunião da SBPC. Já contei aqui de uma certa viagem em que, numa cidade chamada Chapada Gaúcha, que abriga parte do Parque Nacional Grande Sertão: Veredas, no noroeste de Minas,  encontrei toda espécie de produtos à venda e que aludiam ao "sertão". Pareceu-me que até "orgulho de ser sertanejo" estava sendo oferecido à admiração consumista dos turistas. O problema (é verdadeiramente um problema teórico) é que há, sim, uma "prática" do sertão: a cidade de Serra Telhada-PE se autodenomina a "Princesa do Sertão do Pajeú"; a cidade de Feira de Santana-BA ostenta, acho que orgulhosamente, em seu acesso leste um enorme arco em que se lê "portal do Sertão", há um jornal em Custódia-PE chamado "Portal do Sertão". Eu poderia estender esses exemples, mas não julgo necessário. Há duas coisas imediatas aqui: no caso de Chapada Gaúcha-MG, assim como o "Portal Grande Sertão: Veredas" em Cordisburgo-MG, as ações, a praxis decorre da literatura, algo como que um deslocamento da matriz do mito literário, que de fato é o sertão; o professor da Unimontes eu não sei se conhece o mito literário e defende algo absolutamente diverso: que o sertão existe de fato, que o sertanejo se afirma como uma das formas do "cerne da nação", evocando e se opondo a Euclides da Cunha. O professor defende: o sertão-práxis que ele diz existir é um sertão-diversidade, um dado da matriz do mito, que o sertão de fato é um registro da pluralidade brasileira, com vários nomes e habitantes: veredeiros, vaqueiros, pescadores, catingueiros, barranqueiros, geraizeiros... O pouco de minha Antropologia me ensina que a única ação possível dentro do mito é a ritual. Impossível outra voz de dentro do mito. Do mito só se fala de fora dele ou se trata de rito. Acho que vou dormir com essa. Depois recomeçar tudo: Lévi-Straus, Mauss, Mircea Eliade, Jung, Bachelard e Victor Turner terão que resolver isso para que possa eu continuar operando, mesmo com e depois da fala do professor montesclarense.

Imagens: famigegeradacia.blogspot.com e farolcomunitario.com.br

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