segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Carmelitas

O que mais me impressionou na adro da Igreja de Nossa Senhora do Carmo foi a brancura do ambiente. Não há tanta ostentação, reina uma imensa tranquilidade nessa construção pequena, em relação às demais. Está muito bem cuidada e cobra pela visita para fotos. Um real, mas cobra.




Quando saio para essas viagens, procuro me desfazer de conceitos que carrego comigo e deixar que o meu olhar seja provocado pelas coisas que vejo. É claro que é uma atitude idealista e dificilmente realizável. Sigo sempre interpretando, mas guardo essas interpretações (minhas) para que resultem, depois, se for o caso, em outros textos. Este espaço é dedicado a registos, talvez voltar a eles um dia... Tanto isso é ideal, que não consigo, por exemplo, ficar sem dizer algo sobre o problema do centro e da periferia. Primeiro, algo mais prosaico. Antonil, ou o Jesuíta João Antônio Andreoni, como queiram, nosso primeiro economista, disse sobre São João del-Rei (naquele tempo ainda Arraial do Rio das Mortes): "É a principal estalagem aonde os passageiros se refazem, por chegarem já muito faltos de mantimentos (...) é o lugar mais alegre, e capaz de se fazer nele morada estável, se não fosse tão distante do mar". Cito Luiz Melo Alvarenga. Depois, a perspectiva centro-periferia se amplia, pois com a elevação do arraial à condição de Vila, em 1713, a nova Comarca não tinha limites a Oeste; tinha ao Norte, com Sabará, ao Sul com Guaratinguetá e a Leste com Vila Rica. Vale dizer: em 1713, para os representantes da Coroa, ao sul de Guaratinguetá, a leste de Vila Rica e a Norte de Sabará tudo era sertão desconhecido. São João del-Rei já foi um desses limites, a oeste, e o sertão foi sendo empurrado para dentro do país, mas um pouco dele ficava onde sempre esteve. Agora algo mais poético: o centro, na Commedia, de Dante Alighieri, está deslocado espiritualmente. Não se tratava mais de um universo hierarquicamente organizado ou os termos da hierarquia eram outros. Cristo pouco aparece no grande poema de Florença. Há um deslocamente para a figura da mulher e três delas dominam a obra: Nossa Senhora, Santa Luzia e Beatriz. O poema de Dante responde a uma movimentação artística que alterava todo o panorama da concepção medieval, que distinguia o Homem da Natureza e destes com o Criador. Nas artes plásticas isso pode ser visto com bastante nitidez nos trabalhos de Giotto, grande amigo de Dante. Mas ambos, Giotto e Dante, respondem já à movimentação espiritual de São Francisco de Assis, que pregava aos pássaros e às flores. O Homem foi ao encontro da Natureza, a sua natureza, sua matéria, a mesma de que é feito e de que é parte. Creio que esses aspectos foram marginais até Dante. Com o sorriso e o olhar de Beatriz, com a luz que emanava deles, Dante nos deu um novo centro, em certa medida, e se fosse possível dizer, descentralizado. Confirmava a atitude franciscana. Em São João del-Rei a Igreja de São Francisco de Assis foi construída na então periferia da cidade.

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