quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

A cidade e a alma


"Se quiséssemos criar uma arquitetura de acordo com o nosso tipo de alma, disse Nietzsche, o labirinto deveria nos servir de modelo. A vanguarda [do início do século XX] adotou este modelo nietzscheano: sem falar de Borges, tão fascinado pelo tema, lembremos a estrutura do Ulisses, que imita também em certa medida - como assinala Arnold Hauser - a estrutura de uma cidade, com sua rede de ruas e praças ramificadas. A cidade moderna é o labirinto arquitetônico que o homem criou à imagem de sua alma. Mário [de Andrade] persegue essa identidade nos poemas da Paulicéia...: manipulando suas antíteses, reticências e exclamações, cria um traje de arlequim que veste tanto o trovador quanto a metrópole. No poema "Inspiração", a luz e a bruma, o "forno e inverno morno" - que caracterizam o espaço de São Paulo - são transportados para o traje de losangos cinza e ouro do arlequim. No poema "O trovador", as "primaveras de sarcasmos" e o frio intermitente - que caracterizam o "coração arlequinal" - correspondem à luz e à bruma, ao forno e inverno morno do poema anterior. E os versos final de ambos exprimem a mesma tensão: São Paulo é "Galicismo a berrar nos desertos da América!", enquanto o "eu" se define como "Sou um tupi tangendo um alaúde!". João Luiz Lafetá sobre a poesia de Mário de Andrade, em A dimensão da noite.

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